Orfeu Rebelde
Orfeu rebelde, canto como sou:
Canto como um possesso
Que na casca do tempo, a canivete,
Gravasse a fúria de cada momento;
Canto, a ver se o meu canto compromete
A eternidade no meu sofrimento.
Outros, felizes, sejam rouxinóis...
Eu ergo a voz assim, num desafio:
Que o céu e a terra, pedras conjugadas
Do moinho cruel que me tritura,
Saibam que ha gritos como há nortadas,
Violências famintas de ternura.
Bicho instintivo que adivinha a morte
No corpo dum poeta que a recusa,
Canto como quem usa
Os versos em legitima defesa.
Canto, sem perguntar à Musa
Se o canto é de terror ou de beleza.
Miguel Torga
E como este blog não é, nem pretende ser um crítico da sociedade actual a tempo inteiro, por vezes sabe bem falar sobre poesia. Pois bem, faz hoje 12 anos que chegou a «salvação» a Miguel Torga (era como ele descrevia a morte, por o fazer regressar à sua terra), pseudónimo de Adolfo Correia da Rocha. Não era de todo o meu poeta preferido, embora o poema acima descrito seja um dos mais espantosos da poesia do século XX. Partindo então do princípio que muitos não têm grande noção de quem foi Miguel Torga, aqui ficam umas ligeiras noções biográficas:
Nasceu em São Martinho da Anta, a 12 de Agosto de 1907. Cresceu no seio de uma família humilde, e teve uma infância bastante árdua, passada no campo. A sua educação teve uma grande influência católica, vindo a tornar-se num dos motivos principais da sua angústia contínua durante toda a sua vida. Depois de ter estado 5 anos no Brasil, voltou para tirar o curso de medicina em Coimbra. Toda a sua vida e sobretudo a sua obra poética são marcadas por um desgosto constante associado à vida na cidade, isto é, o dilema de querer ir para o campo, que no fundo era a sua terra mãe, mas não o poder fazer, por se ter que sustentar através dum emprego e duma vida que não lhe agrada.
Morre então a 17 de Janeiro de 1995.
Como referi anteriormente, não é o meu poeta preferido, mas como saber também não ocupa lugar, aconselho desde já a leitura cuidada de alguns poemas deste autor, sejam eles quais forem, tendo em conta que a temática não se altera muito.
Cumprimentos, Simão Martins
6 comentários:
Acho que quase 100% dos leitores do teu blog realizaram ou pelo menos frequentaram o 12º ano,tirando um ou outro "anonymous" por quem eu não ponho as mãos no fogo por isso talvez seja mais acertado dizer 95% dos leitores, por isso acho que essa pequena parte da bibliografia de Torga foi escusada.
E já agora, eu diria que ser poeta, é ser mais maior grande :P
Eu não frequentei o 12º ano (ainda)!
Sempre adorei o Miguel Torga, não só pelos poemas, mas pela maneira especial que ele tinha de ver o mundo. Que artista é que não a tem?
Deixo aqui um excerto do meu poema preferido dele:
«Homens do dia a dia
Que levantem paredes de ilusão!
Homens de pés no chão,
Que se calcem de sonho e de poesia
Pela graça infantil da vossa mão!»
P.S.: Para quando a biografia da D. Florbela Espanca? =D
o Torga, o Torga...
muito apegado à terra, o gajo.
e pelo que dizem, era um bom médico!
fora de brincadeiras, o Torga foi um óptimo poeta, e pronto, não há mais a dizer ;)
beijinho, simãozinho *
poetices... ^_-
12º Ano?
Não há limite para a poesia
Estamos sempre a aprender,
estamos sempre a descobrir.
Eu estava-me a referir aos dados biográficos do poeta.
Quanto ao "estamos sempre a aprender e sempre a descobrir" tenho de admitir, que pouco mais descobri e aprendi na poesia dos autores portugueses do que confusão, indecisão e miséria emocional (deles)... é essa a mensagem que eles nos dão? Do quão miseráveis eles são/eram?
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