segunda-feira, junho 02, 2008

Acerca de Profissionalismo e Hipocrisia


Foi com muita curiosidade que, na passada 6ª feira, me pus a ver o concerto da famigerada Amy Winehouse que estava a ser transmitido pela televisão, naquele que foi o 1º dia do Rock in Lisboa 2008. Depressa a curiosidade deu lugar à perplexidade e ao espanto. Não pelo mais que óbvio estado miserável em que a cantora se apresentou no palco, porque quem tem a paixão pelo mundo da música como eu, há muito que está habituado a ver o nome de Amy Winehouse nos escaparates devido às suas aventuras e complicações com a droga e o álcool, dizia eu que não tanto em relação a isso, mas mais em relação ao absurdo da questão.


Não foi portanto com surpresa que vi aquela rapariga franzina a subir ao palco, cambaleante, desorientada, naquele seu estilo próprio de dançar timidamente ao ritmo das músicas a que dá voz. Mas na 6ª passada não foi isso que aconteceu. Amy Winehouse não deu voz a nada. Ou se deu, não terá sido à sua música, mas antes à alimentação de uma imagem que a persegue há muito tempo, imagem essa que alimenta todo um hype, a meu ver, inexplicável, e que levou 90 mil pessoas a esgotar o primeiro dia do Rock In Rio (bom, ok, talvez a Ivete Sangalo e os nossos amigos brasileiros tivessem dado uma ajuda).

Vamos lá a ser francos: Amy Winehouse tem uma voz espantosa, sim, mas é só. Ela nasceu com um dom e um talento que muitos matariam para ter. E inexplicavelmente, ela não quer saber disso. A sua música não tem nada de inovador, é apenas revivalista. Sim, ela construiu todo um imaginário e um visual próprio, que a torna única. Pois, mas também os Tokio Hotel o fizeram.
Aquilo a que se assistiu na passada 6ª feira, não foi mais do que um circo lamentável, um espectáculo triste. Como é que alguém se deixa expôr daquela maneira? Não só é uma falta de respeito para com o público, mas principalmente para com os membros da sua banda, que ensaiaram durante 2 semanas que antecederam o espectáculo, sem que Amy tivesse comparecido a um único ensaio. E que falta de respeito por si mesma.
Ao olhar para o que a televisão me mostrava, não vi diferença entre a rapariga que estava a (tentar esforçadamente) "cantar", ou uma drogada que pede esmola, ou anda a arrumar carros para comer. A diferença está em que uma faz 8€ num dia, e a outra, 8000 numa hora.

Naquele que era o único concerto marcado para 2008 (sem contar com o facto de que não actuava desde Novembro de 2007), Amy Winehouse apareceu no palco atrasada, afónica, drogada e provavelmente embriagada, com um pulso ligado, um corte no braço e uma escoriação no pescoço, esqueceu-se da letra várias vezes, alterou a estrutura de músicas, tropeçou, cambaleou, tentou várias vezes por uma guitarra ao pescoço (precisou da ajuda de um roadie para o fazer), e única coisa que se lembrou de dizer ao público foi que o marido saía da prisão daí a poucas semanas. Seria de esperar o mínimo de preparação e antecipação para um concerto absolutamente isolado. Ah sim, mas disse que a voz dela estava uma merda. Palavra que não me teria apercebido disso se ela não o dissesse...


É mesmo com muita tristeza que vejo alguém desperdiçar um talento como o de Amy, mas poucas pessoas mais há a culpar, senão ela própria. Sim, claro que ela tinha a pressão da editora e o peso da expectativa da crítica nas costas (parece que do outcome deste concerto dependia uma digressão pelos EUA - escusado será dizer que as perspectivas não são boas). Mas é assim há já algum tempo. O que mais me entristece é ver alguém chegar a tamanho estado de degradação e auto-humilhação, ao vivo e em directo. É ver que o que é explorado não é a música, não é a voz, nem mesmo o ambiente 50's que rodeia o culto Amy Winehouse, mas sim a imagem de uma toxicodependente, uma pessoa frágil, com sérios problemas, e que caminha rapidamente para uma espiral de auto-destruição com um fim muito negro. É ver alguém a lucrar com isto.

E tudo, só "por um mundo melhor"...

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